[Artigo] As águas do Mendanha

Por André Luis Mansur

Uma situação que sempre se repetiu no Rio de Janeiro, infelizmente, foi a dos estragos causados pelas chuvas torrenciais no verão. Isso em todas as áreas da cidade, desde o período colonial. Na então Zona Rural não foi diferente, como noticia o jornal “A Noite”, em 14 de fevereiro de 1931: 

“A calamidade das enxurradas – O Mendanha sofreu, também, grandes prejuízos na sua lavoura

No Mendanha, onde passa o Guandu do Sapê, com o transbordamento desse rio, cujas águas foram muito aumentadas pelo cachoeiral, todas as roças ficaram completamente devastadas, inclusive grandes laranjais”.

É interessante notar como o jornal fala também nos laranjais, mostrando que a produção da fruta, já no início da década de 30, era uma força no bairro e iria se desenvolver mais ainda nas décadas seguintes. Muitos moradores perderam seus pertences, mas não houve uma grande tragédia, já que na região o adensamento populacional era pequeno. Mesmo assim, dois meses depois, o mesmo jornal noticiou, na edição de 27 de abril:

“Um lavrador, ao passar ontem, cerca das 12 horas, pela Estrada do Mendanha, em Campo Grande, deparou, no rio daquele mesmo nome, com o corpo de um homem que fora levado até ali pelas enxurradas”. O comissário do 25º distrito conseguiu a identidade do morto, o lavrador Marinho de Oliveira, “de 26 anos, solteiro, de cor preta, morador do mesmo lugar”. 

Nas fotos que ilustram este artigo vemos o estrago feito em outras partes do bairro, como na ponte do Rio Cabuçu e na Estrada Rio-São Paulo. Nestas tempestades de verão, que se tornariam parte do cenário do Rio de Janeiro, o transbordamento dos rios é inevitável, sejam aqueles cobertos ou os que seguem a céu aberto, como na Serra do Mendanha, onde existe um Parque Natural, com cachoeiras, que recebe muitos visitantes. 

Embora a localidade conhecida hoje no bairro como Rio da Prata fique no final da Estrada do Cabuçu (há outra localidade de mesmo nome em Bangu), no passado, conforme vimos acima, o Mendanha também era chamado de Rio da Prata, que era descrito assim, na época das enchentes citadas: “O Rio da Prata do Mendanha nasce com o nome de Prata nas vertentes da chamada serra da Grota Funda, até encontrar com o Mendanha originário das vertentes da serra do Gericinó ou da Cachoeira, um dos limites com o Estado do Rio e onde se origina o Sapucaí. Daí o rio prossegue em descida, até afluir no Guandu mirim, com o nome de Rio da Prata do Mendanha, tendo por afluente na margem direita o Guandu do Sena, que nasce nas vertentes do Guandu. O curso do Prata do Mendanha é de 13,5 quilômetros”. (Careta, 30/12/1933) 

Naquela época, o Mendanha já possuía, como estrada principal, a Estrada do Mendanha, calçada com Macadame (pavimento para estradas desenvolvido pelo engenheiro escocês John Loudon McAdam), “com 7 kilômetros de comprimento por 6 metros de largura; principia na Estrada Rio-S. Paulo e termina no fim da Estrada do Engenho, no largo do Mendanha, e onde principia a subida da serra do mesmo nome”. (Revista das Estradas de Ferro, 30/12/1928)

O Mendanha também sofria com enxurradas em outra situação, que ocorre até hoje, descrito pelo jornal “Correio da Manha” naquele mesmo ano de 1931: “Comunicam-nos do gabinete do inspetor geral de Águas, que devido a um acidente na linha adutora do Rio da Prata do Mendanha, ficará prejudicado hoje o abastecimento d´água nos seguintes lugares: Realengo, Vila Militar, Escola de Aviação, Ricardo de Albuquerque, Anchieta e Nilópolis”.  (Correio de Manhã, 31 de março de 1931)

Compartilhe:

Compartilhar no facebook
Compartilhar no twitter
Compartilhar no linkedin
Compartilhar no email
Compartilhar no print

2 comentários “[Artigo] As águas do Mendanha”

Deixe uma resposta para Laila Vils Cancelar resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *